O mundo dos zumbis

Não costumo assistir séries de TV, mas um dia desses dirigindo meu carro pelas ruas de São Paulo, vi um zumbi. Não era um daqueles com roupas esparrapadas, e a cara cheia de feridas, de uma maquiagem mal feita, mas era um zumbi.

Era uma pessoa de carne e osso que estava viva, mas andava com passos lentos, tropeçando, com a cabeça baixa, e assim como a maioria dos zumbis que conheço, dotado de uma voracidade enorme.

Ao expandir um pouco mais o meu campo de visão, de repente me vi no meio de um monte de zumbis, todos eles, andando, dirigindo, comendo, mexendo em seus smartphones, com uma voracidade enorme.

E comecei a pensar… Será que também não tinha me tornado um zumbi?

Aí comecei a me lembrar dos filmes de suspense e terror que assistia na minha adolescência, e a refletir sobre a essencia dos zumbis.

Os zumbis eram seres mortos-vivos, que aparentemente não eram dotados de uma grande astucia ou inteligência e tinham um único objetivo: Sobreviver, à custa de carne humana. Havia um único foco, uma voracidade insaciável por um prazer imediato, no meio de uma luta pela sobrevivência (estranho falar em sobrevivência para um ser morto-vivo, mas era assim que os filmes eram…)

E quando percebi essa essência tive a certeza. Eu estava em um processo de zumbificação (se é que esse termo existe). Imerso em uma voracidade por informação, entretenimento, passatempo, me percebi no meio do transito tentando acessar o facebook, olhando ao mesmo tempo o portal de notícias e respondendo mensagens no Whatsapp. Eu estava me tornando um zumbi.

Quase um escravo da informação e da conexão, percebi o tamanho do sofrimento que era gerado toca vez que meu telefone ficava sem sinal… Como se o 4G fosse tão o mais importante do que o ar que eu estava respirando naquele momento. O ar não era importante.

E assim como quando você decide comprar um carro, de um determinado modelo, você só enxerga esse modelo na rua, passei a observar todos os tipos de zumbis que havia ao meu redor.

Zumbis da informação, zumbis da conexão, zumbis workaholics, zumbis afetivos, zumbis hedonistas, todos eles com uma voracidade enorme por aquilo que era seu objeto do desejo, mas aparentemente sem consciência.

E começava naquele momento o processo de deszumbificação (agora sim um neologismo).

Tomar consciência desta voracidade inconsciente e muitas vezes inconsequente, foi bastante doloroso, mas como todo remédio amargo, trouxe uma nova visão.

E devagar, tenho tentado, fazer uma coisa de cada vez. Percebendo o propósito de cada ato, e suas possíveis consequências. Ainda vejo, por vez ou outra as mensagens que teimam em pipocar nos aplicativos, mas cada vez mais tenho me policiado a me ater àquilo que me propuz a fazer. Seja dirigir, comer, conversar.

O zen budismo traz como ensinamento, “faça uma coisa de cada vez”, mas nos dias de hoje isso é bastante desafiador.

Acho que foi um começo de um Despertar. Recomeçar a fazer uma coisa de cada vez, tem sido uma tarefa árdua, mas gratificante, e esse exercício tem liberado algum espaço na minha mente para poder perceber a realidade sobre um outro ângulo.

Ainda me percebo em alguns momentos, procurando por algo para inebriar os meus sentidos, como se isso fosse um descanso para as tensões do dia a dia, mas se o que gera a tensão é a própria voracidade de informação…

E você? Tem sede de que? Tem fome de que?

crédito imagens: Istock